WTF is Brazilian Grime? A Conversation with Gau Beats, Peroli, ANTCONSTANTINO, Puterrier and Biggie Diehl | Mel Rheingrüber

December 13, 2022

image: Wander Scheefër

Ever since I saw N.I.N.A. on Prêmio Nacional RAP TV, a virtual ceremony filmed at Brasil Grime Show’s studio in Rio de Janeiro, I’ve been obsessed. The woman I saw on the screen was out of this world, or, better yet, into this world as the bpms ran and her voice jumped onto them, merging with the deep beat. As an atheist, I remember this moment as an insane sensation of faith. Faith in the music to come in our region. And the obsession grew… I felt the urge to know more about grime and started to believe that what exists between an MC and DJ is the closest thing to true love. Sometimes love is sharing the darkest shit in the company of the grimiest beat. Brazilian grime puts a smile on my face while I’m dancing to a song about having no money in my bank account. And I should probably close by commenting on grime culture as an ally to social movements, or on what happens when art becomes a literal narration of a peripheral experience, etcetera. But I think it is better to listen to the people embodying the culture, along with their friends—the artists, curators, and connectors. I hope you enjoy the conversations as much as I have enjoyed talking to these members of the grime vanguard:

GAU BEATSPEROLIANTCONSTANTINOPUTERRIER & BIGGIE DIEHL

—Mel Rheingrüber

GAU BEATS

Gau Beats | image: Jean Luis Fotografia 

Mel
So why grime? How did you start producing it?

Gau
I ended up interested in producing grime because I’ve always been listening to all kinds of music. Since I already knew the music and, more or less, the tools, I started taking a course during the pandemic. It was then I started producing. From the beginning, since I liked grime, drill, afrobeat, and those kinds of rhythms, I started focusing on them. I don’t have a lot of music made out of more popular genres like trap or boombap. I wanted to focus on a market that hadn’t boomed yet, at least when I started.

Mel
Então, por quê grime e como você começou a produzir?

Gau
Como já conhecia a música e já sabia mais ou menos as ferramentas, comecei a fazer um curso durante a pandemia mesmo. E foi aí que comecei a produzir. Desde o início, como já gostava muito desses ritmos, grime, drill, afrobeat, comecei realmente focar neles. Eu não tenho muitos trabalhos em outros ritmos mais conhecidos como o trap e o boombap,  realmente quis focar nesse mercado que ainda não era um mercado muito conhecido quando eu comecei.

Mel
Since when have you been following the scene?

Gau
For quite a long time… I listened to and followed the scene, and from the start I knew it was a genre that was kind of different, with its roots in electronic music. Because here we were used to listening to genres that come from rap itself.

Mel
Está acompanhando a cena do grime faz quanto tempo?

Gau
Há bastante tempo já, já ouvia, já acompanhava. E no início não sabia que era um gênero que era diferente assim, que era um gênero que tinha uma vertente da música eletrônica. Porque a gente estava acostumado a ver gêneros que vem do rap mesmo.

Mel
But why grime specifically? I was trying to find a reason for the fact that—at least in underground culture—grime has exploded this year in Brazil.

GB
I think grime and Brazilian aesthetics are pretty much alike, and the issue of football really hit, and I think that was one of the things that caught people’s attention the most. At least, everyone I talk to mentions grime’s aesthetics. And, also, it really is a genre that manages to explore a little more than rap, that manages to mix more rhythms, that manages to put funk lyrics on top of a grime beat. So I think it's more a matter of aesthetics and getting very close to the periphery as well. We see something of our roots. Maybe it's an affective memory that talks to us.

Mel
E ficou interessada particularmente no grime por quê? Fiquei pensando por que é que -pelo menos no ambiente underground- o grime estourou tanto esse ano no Brasil…

Gau
Eu acho que a estética é muito parecida, bateu muito a questão do futebol, acho que foi uma das coisas que mais chamou a atenção do pessoal mesmo. Pelo menos todo mundo que eu converso me fala sobre a questão da estética. E porque realmente é um gênero que consegue explorar um pouco mais além do rap, que consegue misturar mais músicas, que consegue colocar uma letra de funk em cima de um beat de grime. Então eu acho que é mais a questão da estética e de se aproximar muito com a periferia também. A gente vê alguma coisa da nossa raiz…Talvez seja uma memória afetiva que conversa com a gente.

Mel
I would like to know a little about the grime community in Porto Alegre. What are the relationships like? Do you work with your friends? How do you experience grime in your context?

Grime Station | Gueto Anonimato Records

Gau
Speaking of our state, Rio Grande do Sul, when we started the Grime Station project here, we realized that a lot of people were interested. It was a surprise because we didn't know there were so many people doing this. We knew who was already making the music because they came to the studio. But it was once we started recording Grime Station episodes that we realized how many people there were who wanted to make grime. It all came as a surprise, and now there are small movements emerging. But it is very difficult to work with music in Rio Grande do Sul, actually.

Mel
Queria saber um pouco como é a comunidade do grime em Porto Alegre e como são essas relações entre vocês? Você trabalha com os seus amigos, tem um mercado lá? Como é que você vive isso no seu contexto?

Gau
Falando do Estado mesmo (Rio Grande do Sul), quando a gente começou com o projeto do Grime Station aqui, a gente percebeu que tinha muitas pessoas interessadas no grime. E foi uma surpresa porque a gente não sabia que tinha tanta gente fazendo isso. A gente conhecia quem fazia grime porque era quem vinha aqui no estúdio , como a gente já estava trabalhando com isso, geralmente era o pessoal que procurava a gente para fazer algum trabalho direcionado para o gênero. E quando a gente começou a fazer o Grime Station, a fazer as gravações dos episódios que a gente percebeu quantas pessoas que tinham aqui queriam fazer grime. Então realmente foi uma surpresa para a gente, a gente nem sabia e agora até tem festas, são pequenos movimentos que vão surgindo. E aqui é muito difícil, é bem difícil trabalhar com música no Rio Grande do Sul na verdade.

Mel
What makes doing the work difficult compared to in other states like São Paulo and Rio de Janeiro?

Gau
We have our own studio, right? So we have a recording console. We had to invest in recording equipment, etcetera. At the beginning we had a raffle and people really participated, so that's how we got the money to do the project. It really is an independent project and sometimes it is very complicated. Now we are managing to maintain ourselves, but that's it. We really don't have help.

Mel
E quais são as coisas que dificultam o trabalho, em comparação com outros estados como São Paulo e Rio de Janeiro?

Gau
A gente tem o próprio estúdio né? Então a gente tem uma estrutura de gravação e teve que investir em equipamento para gravação mesmo, teve que comprar caixa, retorno, etc. Por isso no início a gente fez uma rifa e o pessoal super participou, então foi assim que conseguimos o dinheiro para fazer o projeto. Realmente é um projeto independente e às vezes é bem complicado, agora a gente está conseguindo se manter mas é isso, realmente não temos ajuda.

Mel
And in the digital environment it is difficult to get paid because the genre has a number of samples and unauthorized uses that some software platforms simply delete. So, like here in Buenos Aires, sometimes it's the artists who have to support each other.

Gau
It's between us. We have people who record, who edit, so it's all about support, people who believe in the project. As the genre is very new, we do not yet have an expectation of seeking sponsorship.

Mel
E no ambiente digital fica complicado ter uma retribuição porque o gênero tem uma quantidade de samples e usos não autorizados que algumas plataformas simplesmente apagam… como aqui em Buenos Aires às vezes são os mesmos artistas os que se sustentam entre a gente…

Gau
É entre a gente assim. A gente tem um pessoal que grava, que edita, então é tudo por apoio mesmo, pessoas que acreditam no projeto. Como o gênero é muito novo, a gente não tem ainda uma expectativa de procurar patrocínio… 

Mel
Returning to the question of community, could you tell us about your close contacts now?

Gau
Here in Rio Grande do Sul, we are working with Síganus. They are an incredible trio, and we’re working on their album. And it's not just because they're our label’s artists—it's wild what they do. I'm working with Nic Dias too, an artist from the northeast. Since I started listening to Brazilian grime, she's been my biggest reference. I’ve also been listening to SD9 and VND from the beginning.

Mel
Voltando à questão da comunidade, poderia contar pra gente quais são as suas referências no grime brasileiro atualmente?

Gau
Aqui no Rio Grande do Sul a gente está com o pessoal da Síganus, são um trio incrível e a gente está trabalhando no álbum deles também. E não é só porque são artistas da gravadora, é muito louco o que eles fazem. Estou trabalhando com a Nic Dias também, ela é uma artista do nordeste… desde que eu comecei ouvir grime brasileiro ela é a minha maior referência. O SD9 e o VND também eu escutava desde o início.

PEROLI

Peroli | image: Olivia Yokouchi

Mel Rheingruber
I was very curious when I listened to your music and checked out your social media to see that you identify as a connector. I'd like to talk a little bit about that if you want. What does it mean to you to be a connector? I am particularly interested in how communities in Brazilian grime are formed. You work both in São Paulo and London?

Peroli
I always say that regardless of the distance between us we have many more similarities than differences. This point is interesting because even before going to London I had an idea about it because I was already in contact with people there doing the same things as me. I realized that we face the same problems only in different places. What is different in São Paulo—now that I’ve been to London I can say this—is that, even though there are ego fights and stuff here too, we still manage to make things happen. Here we know that we’re going to keep seeing each other all the time, so there's no way we can get into a fight with someone since we know we'll work together. London doesn't have that so much anymore, so when people don't like someone they just don't like them. They don't work together, they don't do anything together, everyone stays in their corner.

I started calling myself a connector because in addition to being a DJ I was already doing other things. I also worked with advertising agencies, and I did a bit of curation. There was always this thing of meeting different people from different areas and introducing them and those relationships evolving into working together in the future. At the beginning of the pandemic I started to reflect: What do I do?

Mel
Fiquei bastante curiosa ao escutar a sua música e dar uma olhada para as suas redes com essa identificação sua como conectora. Então gostaria de falar um pouco disso se você quiser… O que significa para você ser uma conectora? Tô particularmente interessada em saber como essas comunidades no grime brasileiro são formadas. Porque você trabalha tanto em São Paulo como em Londres então tem essa visão das duas cidades…

Peroli
Então, eu sempre digo que por mais distante que a gente esteja, a gente tem muitas mais similaridades do que diferenças. E é interessante esse ponto porque mesmo antes de ir pra lá eu já tinha essa noção tendo contato com outras pessoas fazendo a mesma coisa do que eu lá. E eu percebi que a gente enfrenta os mesmos problemas em lugares diferentes. O que é diferente, agora que eu fui posso dizer, por exemplo em São Paulo por mais que tenha briga de ego e essas coisas, aqui a gente meio que além disso, ainda a gente consegue fazer as coisas acontecerem. Porque a gente sabe que vai se encontrando em todos os momentos então não tem como a gente criar uma briga com alguém já que em algum momento a gente vai trabalhar junto. Londres já não tem tanto isso assim, quando o pessoal não gosta de alguém não gosta. Não trabalha junto não faz nada e cada um no seu canto.

Mas eu comecei a me denominar assim como conectora porque além de ser DJ antes eu já fazia muitas outras coisas. Eu também trabalho com agências de publicidade, então fazia um pouco de curadoria mesmo. Sempre tinha essa coisa de conhecer diversas pessoas de várias áreas e apresentá-las e aquela relação evoluir num trabalho no futuro. No começo da pandemia comecei a refletir: O quê é que eu faço?

Mel
In London did you connect with people you already knew or not so much?

Peroli | image: Naju Saturno

Peroli
In some cases. In 2020, before the pandemic, MINA came here. She is a producer from London and works with African artists. Now she works with an artist from Ghana, has a collective and has her label there, so there was this connection. There is Blue Canariñho, someone who uses Brazilian rhythms and Spanish rhythms as well, because he has this heritage. There is OBLIG, a grime DJ…through them I got to know several people, but I’ve also introduced myself, sent a message, presented my sound and what I play.

I just wanted to go to London but I had no intention or notion of what was going to happen. In the pandemic everything was on stop, so I did what I could from a distance. Between 2020 and 2022, I did about eighteen online radio shows and podcasts. I was trying to create relationships with people during that period. And, at the same time, I was bringing grime here. A lot of people here don't speak English and that's a barrier. Sometimes people think they can't reach other people because of this barrier. So I thought, “How can I help these people by being that bridge?”

Mel
Você fazia contato com pessoas que já conhecia anteriormente ou não sempre?

Peroli
Teve alguns casos, em 2020 antes da pandemia a MINA veio para cá, ela é produtora de Londres e ela trabalha com artistas africanos, agora ela trabalha com uma artista de Ghana, ela tem um coletivo e tem o selo dela lá, então tem essa conexão. Tem o Blue Canariñho que é uma pessoa que usa ritmos brasileiros e ritmos espanhóis também porque ele tem essa descendência, tem o OBLIG que ele um DJ de grime…

Através deles e fui conhecendo várias pessoas mas teve a situação também de eu me apresentar, mandar mensagem,  apresentar meu som, apresentar o que eu toco. Mas assim, até então eu tinha só vontade de ir pra lá, mas não tinha pretensão nem noção de quando isso ia acontecer. Porque na pandemia estava tudo parado, então eu fazia o que eu podia fazer a distância. Entre 2020 e 2022 eu fiz, sei lá, dezoito programas de rádio online enquanto podcast. Fui tentando criar essas relações com essas pessoas de lá nesse período. E, ao mesmo tempo, trazer para cá porque tipo muita gente aqui que eu conheço são pessoas que não falam inglês e isso é uma barreira. Às vezes as pessoas acham que não podem chegar em outras pessoas por conta dessa barreira. Daí eu pensei ‘Como eu posso ajudar essas pessoas sendo essa ponte?’

Mel
Yes, connecting different languages is a lot like building bridges.

Peroli
I do it because I like it, because I want to. But when I got into advertising in the corporate world I realized, doing research and everything else, how much the right name, how much the person is worth. For example, I did a project that was for Latin America, and it was a project for Facebook. A person from Argentina charged 5,000 dollars to deliver 25 names. And, I was like: “Guys, people sell names.” I thought about how to work with it in a humanized way because people are not products.

I started to think about it, so, for example, Blue Canariñho released a song and sent me a message saying: “I want someone to make a video for my song in this style here.” He gave me an idea of what he wanted, and I knew exactly who could do it. Then I contacted this video maker and hired him. Because Blue Canariñho paid this boy from Brazil in pounds, that money is worth much more. Then I started to be an agent that gives people tips about who to connect with, who they could talk to. I still have the idea of ​​creating a talent agency, of managing people, because I believe that here in Brazil we have a lot of quality in everything and the ability to do a lot with very little… If we had the least amount of structure, a good computer, even a good cell phone, things would be different.

Mel
É, conectar através das diferentes línguas é muito fazer pontes.

Peroli
Eu faço isso porque eu gosto, porque eu quero. Mas quando eu entrei no meio da publicidade no meio corporativo foi que percebi, fazendo pesquisa e tudo mais, quanto o nome, quanto a pessoa vale. Então por exemplo eu fiz um projeto que era para Latinoamérica e era um projeto para o Facebook na época. E uma pessoa da Argentina inclusive cobrou 5000 dólares para entregar 25 nomes. E eu fiquei assim: 'Gente, as pessoas vendem nomes’. Eu pensei em como trabalhar com isso de uma forma humanizada porque as pessoas não são produtos.

E eu comecei a pensar, então por exemplo o Blue Canariñho lançou uma música e ele me mandou uma mensagem falando assim:  ‘Eu queria alguém pra fazer um vídeo pra minha música nesse estilo aqui.’ Ele me mandou uma referência e eu sabia exatamente quem podia fazer. Aí contactei esse vídeo maker e fiz todo o processo de contratação e tal. E por conta da moeda e o fato do Blue Canariñho ter pagado em libras para esse menino daqui do Brasil esse dinheiro vale muito mais, ele cobra muito mais.

Aí eu comecei a ser esse agente que dá dicas pras pessoas sobre quem as pessoas poderiam se conectar, com quem elas poderiam conversar. Ainda tenho essa ideia de fazer uma agência de talentos, de gerenciar essas pessoas porque acredito que aqui no Brasil a gente tenha muita qualidade de tudo. E a capacidade de fazer com pouco… Se a gente tivesse o mínimo de estrutura, um computador bom até um celular bom seria diferente.

Mel
When projects start out underground, it's the artists supporting each other, making things happen, right? Out of the desire to do what you want to do.

Peroli
Yes, it's not just playing out there. As you said, we work among the same people, the same artists, and we have to take care. I try to recommend more girls, recommend more women so that we can bring a little more with us for us. So it's not just about me, being there all the time on the front line playing etcetera. But, at the same time, I don't think it’s mandatory. I do it because I like it. I don't think it's cool when people force it.

Mel
Quando os projetos começam sendo meio underground às vezes são os mesmos artistas que fazem as coisas acontecerem né? Apenas pelo desejo de fazer o que você quer fazer.

Peroli
Sim, não é só jogar lá. E também, como você falou, como a gente trabalha entre as mesmas pessoas, os artistas mesmos, tem que ter um cuidado. Tento indicar mais minas, indicar mais mulheres para que a gente consiga trazer um pouco mais pra cá. Então não é só sobre mim, alí o tempo inteiro na linha de frente tocando e etcéteras. Mas ao mesmo tempo eu não acho que é uma função obrigatória. Eu faço porque eu gosto, eu não acho legal quando as pessoas forçam isso.

Mel
I would also like to know how grime is associated in Brazil with social struggles. Do you think artists and their communities are taking up grime as a response mechanism? Or do you think it's more about aesthetics? Because I thought it makes sense for grime to be so big this year because of the World Cup and the football thing…

Peroli
It’s a little of both. Grime in Brazil has been here since it was born, but the boom happened when MCs understood that they could sing or speak their rhymes on the beats. In 2002 we had songs with elements of grime, but nobody knew what grime was, for example. And those who knew, they produced the instrumentals but from a much more underground place than now. It really broke out in 2019–2020 and I don't know if it’s connected to the World Cup because Brazil has a very special relationship with football at any time. But it can also be a factor we can’t ignore.

Mel
O que eu queria saber também é se o grime está associado no Brasil com as lutas sociais. Você acha que as comunidades de artistas estão se apropriando disso, do grime como uma ferramenta de resposta? Ou acha uma questão mais de estética? Porque pensava que faz sentido o grime ter estourado tanto esse ano com a Copa do Mundo…

Peroli
Eu acho que tem um pouco dos dois. Grime no Brasil está aqui desde que o grime nasceu, só que o boom que aconteceu foi quando os MC 's entenderam que eles poderiam cantar ou falar as rimas deles nos beats. Porque desde 2002 para cá a gente tem alguns dados de músicas que eram consideradas grime mas que ninguém sabia o quê era grime por exemplo. E quem sabia fazia mas fazia os instrumentais desde um lugar muito muito mais underground do que é hoje. O lance é que estourou mesmo no ano 2019, 2020 e não sei se pela Copa do Mundo porque o Brasil tem uma relação muito especial com futebol em qualquer época. Mas pode ser um fator também que a gente não pode anular, acho que faz super sentido.

Mel
There were viral Tweets and TikToks on brazilcore…

Peroli
Yes, but it always existed here! And you know what I find funny? This aesthetic has always been considered something marginalized, but at the same time the whole world has this passion for Brazil. Regardless of whether it's trending or not. I think someone wanted to create a trend and came up with that term, but even when it's not a World Cup year, there's always a celebrity wearing a Brazilian team shirt. So I think Brazil is relevant. It always has been and more than we imagine.

Mel
Também houve a viralização de tweets e tik toks sobre o assunto do brazilcore…

Peroli
Sim, mas isso sempre existiu aqui! E sabe o quê eu acho engraçado? Isso sempre foi considerado algo marginalizado, mas ao mesmo tempo o mundo inteiro tem essa paixão pelo Brasil. Independente de ser tendência ou não. Eu acho que alguém quis criar uma tendência e veio com esse termo mas, mesmo quando não é ano de Copa do Mundo, sempre tem alguma celebridade usando camisa de time brasileiro. Então eu acho que o Brasil é relevante, sempre foi e ele é muito mais do que a gente imagina.

ANTCONSTANTINO

ANTCONSTANTINO | image: Wander Scheeffër

Mel
Tell me a little about your artist name.

ANTCONSTANTINO
My name is Antonio Constantino. I have a clothing brand named ANTCO. I've had it for a long time, even before I worked with music. And then when I started playing I used the name ANTCO DJ SET, representing my clothing brand, and it was a bit of insecurity. I was hiding my full name because I didn't think I knew how to do what I was doing. Then, after a long time, I created the name ANTCONSTANTINO.

Mel
Me fala um pouco do seu nome artístico…

ANTCONSTANTINO
Meu nome é Antonio Constantino… Eu tenho uma marca de roupa que o nome dela é ANTCO, tenho ela há muito tempo, até de antes de eu trabalhar com música. E aí quando eu comecei a tocar botava o nome ANTCO DJ SET que era o nome que representava a minha marca de roupa, era um pouco de insegurança e eu me escondendo porque… não achava que sabia fazer o que eu estava fazendo. Aí depois de muito tempo eu criei o nome ANTCONSTANTINO.

Mel
The aesthetic you have is quite different from the rest of the scene.

ANTCONSTANTINO
Hahahaha

Mel
A estética que você tem está bastante diferenciada do resto da cena.

ANTCONSTANTINO
Hahahaha

Mel
I was talking to Gau Beats from Porto Alegre about football, football team shirts, sport clothes, and so on. I think yours is an aesthetic that is Brazilian but at the same time goes far beyond that.

ANTCONSTANTINO
Yeah, this brazilcore thing… So, my musical references are from rock. The first thing I identified with is rock and funk. I'm much more of a  rocker than a funkeiro. I wear Nike. I wear sports tracksuit fashion and stuff like that, but, for example, I don't like football. I don't think it's funny, so the aesthetic of team clothes, it's not something I identify with. I don't even have a team I follow. And I really like the rock aesthetic, all phases of rock. I like the aesthetics of black metal, death metal, and I've done parties before grime where trap was played, but when I see trap bands like Migos I think it's fun but not something that I feel represented by visually.

I like something darker or more… How can I say this? A bit mystical, right? There are people who sometimes think I'm antichrist, but I don't have any religion, though I've always thought the Occult was cool… Here in Brazil the rock, hardcore, and metalcore scene kind of died. Rock became very reactive with time, very weird. So I think young people won't feel represented in a place that doesn't have anyone who stands for them. And funk, trap and rap, I think, deliver that in a much better way, even when it comes to political issues. Now there are several rock bands that are excellent and deal with protest issues, and so on. There's a line by Bruno Kroz that I think is really cool. He has listened to a lot of rock music, and he hates being called a rocker. He says that as much as he's learned from rock, it's the only musical genre that allows overtly Nazi bands to continue playing at major festivals. But the idea is this: I like grime because it allows me to be who I am, and it helped a lot of other people who came from rock and discovered that shit.

Mel
Lembro do que eu tinha falado com a Gau Beats do Porto Alegre em relação ao futebol, a camisa do time, etc. Eu acho a sua uma estética que tem a sua brasilidade mas ao mesmo tempo vai muito além dessa questão…

ANTCONSTANTINO
É… tipo esse lance do brazilcore… Então a minha referência toda de música vem com rock, a primeira coisa que eu me identifiquei é com rock e funk. Eu sou muito mais rockeiro do que funkeiro, eu uso Nike, eu uso moda de tracksuit e essas coisas mais, por exemplo, eu não gosto de futebol. Não acho graça então logo a parte de roupa de time esses negócios já não me pegam muito. Não é uma coisa com a qual eu me identifico, não tenho nem time pra tú ter noção. E eu gosto muito da estética do rock, de todas as fases do rock. Gosto da estética do black metal, do death metal e eu já fiz festas antes de grime onde  tocava trap… mas quando vejo bandas de trap tipo Migos acho divertido e tal mas não é algo com o qual eu me sinta representado visualmente.

Curto uma parada mais obscura ou mais… como eu posso dizer? Até meio místico né? Tem gente as vezes que acha que eu sou anticristo mas não tenho religião nenhuma, sempre achei maneiro o ocultismo…Então me achei num lugar onde eu consigo trampar com o que eu quero sem precisar de um tipo de roupagem…

É isso até me ajudou porque aqui no Brasil a cena do rock, de hardcore, metalcore ela deu uma morrida. O rock foi ficando muito reaça com o tempo, muito esquisito. Então acho que a molecada não vai se sentir representada num lugar que não tem ninguém parecido com eles. E o funk e o trap o rap acho que entrega isso numa forma muito melhor, até na parte política. Agora tem várias bandas de rock que são excelentes e tratam questões de protesta e demais, a grande maioria do gênero.

Tem uma fala do Bruno Kroz que acho muito foda, ele ouviu muito rock e ele odeia ser chamado de rockeiro. Ele fala que por mais que ele tenha aprendido várias coisas com o rock, ele é o único gênero musical que permite que bandas abertamente nazistas continuem tocando em festivais grandes dentro da parada.

Mas a ideia é essa: eu gosto de grime porque me permite ser quem eu sou e ajudou várias outras pessoas que vinham do rock e descobriram essa parada.

PUTERRIER & BIGGIE DIEHL

Biggie Diehl | image: courtesy of the artist

Puterrier

Puterrier | image: courtesy of the artist

Mel
When I first saw the videos of the Atabagrime EP, I thought, “Is this guy right here trying to make the most Brazilian grime in the world?” Is that only my theory, or was that the purpose of the EP?

Puterrier
Actually, that was the intention. We have been watching the rap scene, the trap scene, and we realized that people were using too many gringo references. The instruments, the tones, the way of singing. It was the musicality and also the aesthetics of the clips. All very gringo. And with the Atabagrime EP I wanted to do something very Brazilian. I wanted to use the local aesthetic, which is the aesthetic of the beach, of the morro.

BIGGIE
Keeping the style of the urban genre, with national tones, within this more electronic thing.

Mel
Quando eu escutei e vi os vídeos do EP Atabagrime pensei ‘esse cara aqui ele está tentando fazer o grime mais brasileiro do mundo’? É só a minha teoria ou essa foi a intenção?

Puterrier
Então essa foi a intenção mesmo, a gente vem observando que na cena do rap, do trap, essa vertente aí, que o pessoal está pegando muitas referências gringas nos instrumentos, os timbres, a forma de cantar. A musicalidade e a estética dos clipes. Tudo muito gringo. E como o Atabagrime EP eu queria fazer uma coisa muito brasileira. Queria usar a estética daqui, que é a estética de praia, de morro…

BIGGIE
Mantendo o estilo do gênero urbano, com timbres nacionais, dentro dessa coisa mais eletrónica

Mel
I'm going to ask something very gringo but… Could you define the atabacada?

BIGGIE
The atabacada is a sub-strand of funk, a specific beat. In funk the main beat is often repeated, with modifications, but the skeleton is the same. The atabacada is a specific skeleton. It's like really fast, 170 bpm.

Mel
Eu vou perguntar uma coisa muito de gringa mas… Poderia definir a atabacada?

BIGGIE
A atabacada é uma sub vertente do funk, uma batida específica. No funk muitas vezes a batida principal se repete, com modificações mas o esqueleto é o mesmo. A atabacada é um esqueleto específico. É desse jeito bem acelerado, 170 bpm.

Mel
And why atabacada?

Puterrier
Because what I used to do was very much just grime, which was very electronic stuff. Then I realized that grime here in Brazil was not being seen as much as rap, as trap. So I thought that was because people weren't mixing funk with grime as much as they should have. I wanted to do something that was 70% funk and 30% grime for people here in Brazil to identify more with the style and not find it so strange.

BIGGIE
We use the grime bass, the rhythm. But the choice of samples, the tone is part of our culture.

Mel
There's even a berimbau sound in the songs.

Puterrier
There is. Samba enredo, berimbau. But people from the scene have the vira lata syndrome, right? This thought that everything that comes from here in Brazil is smaller or not so important. I wanted to bring the concept that here in Brazil there is so much culture, so much musicality.

Mel
E por quê atabacada?

Puterrier
Porque o que eu fazia antigamente era muito só grime que era uma parada muito eletrónica. Aí percebi que o grime aqui no Brasil não estava sendo tão visto enquanto o rap, enquanto o trap. Então pensei que isso era porque as pessoas não estavam juntado o funk com o grime tanto quanto deveriam. Eu queria fazer uma parada que fosse 70% funk  e 30% grime. Para as pessoas aqui do Brasil se identificarem mais com o estilo e não estranham tanto.

BIGGIE
A gente usa os graves do grime, o ritmo. Mas a escolha dos samples, o timbre é da nossa cultura.

Mel
Tem até som de berimbau nas músicas.

Puterrier
É. Samba enredo, berimbau. Mas o pessoal da cena tem síndrome do vira lata, né? Esse pensamento de que tudo o que vem daqui do Brasil é menor ou não é tão importante. Eu queria trazer o conceito de que aqui no Brasil tem cultura demais, musicalidade demais.

Mel
And how do you deal with the fact of using an aesthetic very much of Brazilian patriotism that was used by Bolsonaro, the yellow shirt, while at the same time talking about voting for Lula? I think it's a wonderful act of reappropriation.

BIGGIE
Exactly, the yellow shirt thing—everything back to where it should have always been.

Mel
And do you feel any kind of pressure or responsibility?

Puterrier
Yes, I feel a weight, a responsibility because it's not just my dream, it's Biggie's dream, the guy who sings with me, and the people in production. Everyone who’s on this boat. It also happens that I do a bit of a new thing, so I have to inspire other people to do that style. I've been making music since I was eleven, and I've heard a lot of criticism. Even now, even after the release of Atabagrime EP. But the people who like it, really like it, and really consume it so that helps a lot. They are always there, supporting our work and even converting people who don’t like it.

Mel
E como vocês lidam com o fato de usar uma estética muito do patriotismo brasileiro que foi usada pelo Bolsonaro e ao mesmo tempo falar nas músicas que vão votar no Lula? Eu acho um ato de reapropriação maravilhoso.  

BIGGIE
Exato, a coisa da camisa amarela—tudo de volta para onde deveria ter ficado sempre. 

Mel
E você sente algum tipo de pressão ou responsabilidade?

Puterrier
Sim eu sinto um peso, uma responsabilidade porque não é só meu sonho, é o sonho do Biggie, do menor que canta comigo, das pessoas que estão na produção. Está todo mundo no meio do barco. Também acontece que eu faço uma parada meio nova então eu tenho que inspirar outras pessoas a fazerem esse estilo. Desde os onze anos que eu faço música e já ouvi muitas críticas. Até hoje, mesmo depois do Atabagrime EP sair. Mas quem gosta, gosta de verdade e consome muito, isso ajuda muito. Sempre lá, bancando o trabalho e convertendo até as pessoas que não gostam.

Mel
Who is on your team?

Puterrier
I have a group of people who work with me, including my manager Formiga, who has always fully embraced my work, today our team is only made up of women and LGBT+ people. For me, this is Brazil itself, diversity in all media.

Mel
Women are very good at working, I know…

Puterrier
[laughs] I get along better. Straight talk, it's always been like this, so I wanted to try to bring this to my team too, you know?

Mel
Como está composto seu time?

Puterrier
Eu tenho uma rapaziada que trabalha comigo, entre elas a minha empresária Formiga, que sempre abraçou a parada completamente e hoje em dia o nosso time está só composto por mulheres e pessoas LGBT+. Pra mim isso é o Brasil mesmo, diversidade em todos os meios.

Mel
Mulheres somos muito boas trabalhando eu sei…

Puterrier
[risos] Eu me dou melhor, eu me dou melhor. Papo reto, sempre foi assim então queria tentar trazer isso também para a minha equipe, se ligou.

Mel
And how does it work, having a team made up of women and LGBT+ and at the same time having a video like “Neurose de Novinha”?

Puterrier
It is contradictory because people expect that, because I talk about women like that, I'm a brute guy. But the people who participate feel more comfortable, due to the fact that our team is made up of many women. And the thing about “Neurose de Novinha,” we say a lot “cool, it's just her neurosis,” but we know that we also have our neurosis. Same thing that happens to Maria happens to João. So, it kind of doesn't become a problem for us to know how to act calmly in the face of it.

One thing I also wanted to say bro is that Atabagrime is specific to Rio. Here in Brazil we already have Brime, right? Which is a mixture of funk from São Paulo and grime, but Atabagrime is a mixture of funk from Rio de Janeiro and grime. And also I want to talk about my brother Biggie Diehl who produces this genre and has been with me since “Putaria 2000,” you know the song right?

Mel
I do know it, yes.

Puterrier
The song has two producers, Biggie and Ávila

BIGGIE
And we redid it three times before reaching the final product.

Puterrier
Pedro Bala, too, he's the guy who produced most of the tracks on my EP. He's coming in strong, the track “Atabagrime” has his beat. Ávila, Biggie, and Pedro Bala are the most pioneering producers of the genre.

Mel
E como funciona isso de ter um time composto de mulheres e LGBT+ e ao mesmo tempo ter um clipe como Neurose de Novinha?

Puterrier
A parada é contraditória mesmo porque as pessoas esperam que, porque eu falo de mulheres, eu seja um cara brutão. Mas as pessoas que participam se sentem mais à vontade, pelo fato de ter um time composto por muitas mulheres. E aquele bagulho de Neurose de Novinha, a gente fala muito ‘suave, a neurose é só dela’ mas a gente sabe que nós temos também a nossa neurose. Mesmo bagulho que dá em Maria da em João. Então meio que não se torna problemático para a gente saber agir tranquilo diante disso.

Uma coisa que eu queria falar também mano é que o Atabagrime é específico do Rio. Aqui no Brasil já tem o brime né? Que é a mistura do funk paulista com o grime Só que o Atabagrime é a mistura do funk carioca com o grime. Só que o Atabagrime é a mistura do funk carioca com o grime. E também falar do mano aqui o Biggie Diehl que está comigo desde Putaria 2000, você conhece né?

Mel
Conheço sim.

Puterrier
Essa música tem dois produtores, o Biggie e o Ávila

BIGGIE
E a gente refez três vezes antes de chegar ao produto final.

Puterrier
O Pedro Bala também, ele é o mano que produziu a maioria das faixas do meu EP. Ele está chegando forte, ele fez o beat da faixa Atabagrime. O Ávila, o Biggie e o Pedro Bala são os produtores mais pioneiros do gênero.

Puterrier & Pique Raro | image: courtesy of the artist


Mel Rheingrüber is an artist, curator, and music industry worker. She occasionally writes for Argentinian and international publications such as El Flasherito Diario and A*Desk. @djtremetreme_ / linktr.ee/melisarheingruber 

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